Agostinho:
As Dez Virgens
Agostinho i um dos maiores nomes na
história da Igreja cristã. Ele era um tição arrancado do fogo, como o próprio
Paulo, poderoso troféu do Espírito Santo. Nasceu em Tagasta, África (atual
Souk-Ahras, Argélia), em 13 de novembro de 354, e morreu em Hipona, África, em
28 de agosto de 430. Seu pai era pagão, mas sua mãe, Mônica, era cristã de
maravilhosa beleza de caráter e profundidade de fé. Quando jovem, Agostinho foi
treinado para a carreira da retórica. Ele viveu em pecado com uma moça que lhe
deu um filho, a quem era profundamente dedicado, dando-lhe o nome de Adeodato.
"dado por Deus". Durante esses anos de vida licenciosa, sua mãe nunca
deixou de orar e se esforçar pela conversão dele. Foi a ela que o bispo de
Tagasta fez a célebre observação, que tem consolado tantas mães ansiosas, que
"um filho de tantas lágrimas não pode ser perdido'.
Quando
seguia sua profissão de retórica em Milão, Agostinho pôs-se sob a influência de
Ambrósio, bispo de Milão, e foi levado à vida cristã. Mas ele estava tão
enredado na sensualidade, que se esquivava de sacrifício que envolvesse uma
confissão de fé. Depois de intensas lutas espirituais, descritas graficamente
na sua obra Confissões, Agostinho finalmente achou Cristo e a paz. Em
396, foi feito bispo da sede episcopal de Hipona, na África. Daí em diante,
tornou-se uma das grandes figuras da Igreja daqueles tempos, na verdade, de
todos os tempos. Sua mente poderosa criou uma série de livros, sendo o maior
deles A Cidade de Deus, obra vasta na qual ele procura vindicar o
Cristianismo e concebe a Igreja como uma ordem nova e divina que surge das
ruínas do Império Romano. Engajou-se em muitas controvérsias, sendo a mais
importante a controvérsia com Pelágio e os pelagianos. Contra Pelágio, que
afirmava ser o pecado de Adão puramente pessoal, e afetava só a ele, Agostinho
defendeu a doutrina do pecado original, que os homens herdam de Adão uma
natureza pecadora e. assim, estão sob condenação. Agostinho é aclamado por
todas as escolas da Igreja Crista, e tanto católicos quanto protestantes o
consideram, ao lado do apóstolo Paulo, como o grande mestre em relação ao
significado do pecado e ao passado da natureza humana.
Seu sermão sobre "As Dez Virgens" é um
interessante tratado de um dos grandes temas de púlpito: a Segundo Vinda de
Cristo. Especialmente belas são as palavras finais: "As nossas lâmpadas
alumiam entre os ventos e as tentações desta vida. Mas deixemos que nossa chama
queime fortemente, que o vento da tentação aumente o fogo, em vez de
apagá-lo".
As Dez Virgens
Então, o Reino dos céus será
semelhante a dez virgens..." (Mt 25-1)
VOCÊS
que estavam presentes ontem se lembram de minha promessa, a qual,
com a ajuda do Senhor, será cumprida hoje, não somente a vocês, mas aos muitos
outros que também se reuniram aqui. Não é questão fácil dizer quem são as dez
virgens, cinco das quais são sábias e as outras cinco, tolas. Não obstante, de
acordo com o contexto desta passagem a qual desejei que fosse lida hoje
novamente a vocês, amados, não penso, até onde o Senhor me conceder
entendimento, que esta parábola ou similitude relacione-se somente com essas
mulheres. Estas, por uma santidade peculiar e mais excelente, são chamadas
virgens na igreja, as quais, por um termo mais habitual, também chamamos
"as religiosas"; mas, se não me engano, esta parábola se relaciona
com a totalidade da Igreja. No entanto, embora devamos entendê-la somente
acerca daquelas que são chamadas "as religiosas", não são dez? Deus
proíba que tão grande companhia de virgens seja reduzida a tão pequeno número!
Porém, talvez alguém diga: "Mas, e se embora sejam tantas em profissão
exterior, contudo, na verdade sejam tão poucas, que escassas dez podem ser
encontradas!" Não é assim. Pois se Ele tivesse querido dizer que as
virgens boas só deveriam ser entendidas pelas dez. Ele não teria representado
cinco tolas entre elas. Se este é o número das virgens que são chamadas, por
que as portas são fechadas contra as cinco?
Entendamos,
amados irmãos, que esta parábola se relaciona com todos nós, isto é, com toda a
Igreja, não somente com o clero de quem falamos ontem; nem somente com o
laicato, mas com todos em geral. Então, por que as virgens são dois grupos de
cinco? Estas virgens são todas as almas cristãs. Mas para que eu possa lhes
dizer o que pela inspiração do Senhor penso, não são almas de todo tipo, mas as
almas que têm fé e parecem ter boas obras na Igreja de Deus; e, não obstante,
até entre elas, "cinco são sábias e cinco são tolas". Primeiro,
vejamos por que são chamadas "cinco" e por que "virgens" e,
depois, consideremos o restante. Cada alma no corpo é denotada pelo número
cinco, porque faz uso dos cinco sentidos. Não há nada de que tenhamos percepção
pelo corpo, senão pela porta de cinco dobras: a visão, a audição, o olfato, o
paladar ou o tato. Aqueles que se privam da visão ilícita, da audição ilícita,
do olfato ilícito, do paladar ilícito e do tato ilícito, por causa da sua
incorrupção, receberam o nome de virgens.
Mas
se é bom abster-se dos estímulos ilícitos dos sentidos e. por conta disso cada
alma cristã recebeu o nome de virgem, por que cinco são admitidas e cinco
rejeitadas? Todas são virgens e, não obstante, cinco são rejeitadas. Não é o
bastante que sejam virgens e que tenham lâmpadas. São virgens por causa da
abstinência do uso ilícito dos sentidos; têm lâmpadas por causa das boas obras.
De cujas boas obras o Senhor disse: "Assim resplandeça a vossa luz diante
dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem o vosso Pai, que
está nos céus" (Mt 5.16). Outra vez Ele diz aos discípulos: "Estejam
cingidos os vossos lombos, e acesas as vossas candeias" (Lc 12.35). Nos
"lombos cingidos" está a virgindade; nas "candeias acesas",
as boas obras.
O
título de virgindade não é normalmente aplicado aos casados; contudo, até neles
há certa virgindade de fé que produz castidade de casados. Saibam, santos
irmãos, que todo aquele que, como a tocar a alma, tem fé incorrupta, pratica
abstinência de coisas ilícitas e faz boas obras, não é adequadamente chamado de
"virgem". Toda a Igreja, que consiste em virgens, meninos, homens
casados e mulheres casadas, é por um nome chamada de virgem. Como provamos
isso? Ouçam a declaração do apóstolo Paulo, que diz não somente às mulheres
religiosas, mas a toda a Igreja: "... porque vos tenho preparado para vos
apresentar como uma virgem pura a um marido, a saber, a Cristo" (2 Co
11.2). E porque devemos nos precaver contra o Diabo, o corruptor desta
virgindade, o apóstolo acrescentou: "Mas temo que, assim como a serpente
enganou Eva com a sua astúcia, assim também sejam de alguma sorte corrompidos
os vossos sentidos e se apartem da simplicidade que há em Cristo" (v. 3).
Poucos têm virgindade física; no coração, todos devemos tê-la. Se a
abstinência do que é ilícito é bom, pelo que recebeu o nome de virgindade, e as
boas obras são louváveis, que são significadas pelas lâmpadas, por que cinco
são admitidas e cinco rejeitadas? Se há uma virgem e uma que leva lâmpada, que
contudo não é admitida, onde ela se verá, que nem preserva a virgindade das
coisas ilícitas e que nem desejando ter boas obras anda em trevas?
Destes,
meus irmãos, sim, destes vamos tratar. Aquele que não vê o que é mau, aquele
que não ouve o que é mau, aquele que desvia seu olfato dos fumos ilícitos e seu
paladar da comida ilícita dos sacrifícios, aquele que recusa o abraço da
esposa de outro homem, reparte o pão com os famintos, traz o estranho à sua
casa, veste os desnudos, reconcilia os litigiosos, visita os doentes, sepulta
os mortos; ele com certeza é uma virgem, ele com certeza tem lâmpadas. O que
mais buscamos? Algo, contudo, ainda busco. O santo Evangelho me colocou nesta
busca. Está escrito que até entre estas virgens que levam lâmpadas, algumas
são sábias e algumas tolas. Como vemos isso? Como fazemos distinção? Através do
óleo. Alguma coisa grande, alguma coisa sumamente grande significa este óleo.
Vocês acham que não é o amor? Isto dizemos à medida que investigamos o que é;
não nos aventuramos a julgamento precipitado. Eu lhes direi por que o amor
parece estar significado pelo óleo. O apóstolo diz: "... e eu vos mostrarei
um caminho ainda mais excelente. Ainda que eu falasse as línguas dos homens e
dos anjos e não tivesse caridade, seria como o metal que soa ou como o sino que
tine" (1 Co 12.31b; 13-1). A caridade é o caminho acima dos demais, a
qual com boa razão está significada pelo óleo, pois o óleo mantém-se acima de
todos os líquidos. Coloque água, derrame óleo, e este se manterá sobre a água.
Coloque óleo, derrame água, e o óleo ainda assim permanecerá sobre a água. Se
você mantiver a ordem habitual, ele ficará no ponto mais alto; se você mudar a
ordem, ele continuará no ponto mais alto. "A caridade nunca falha".
Tratemos
agora das cinco virgens sábias e das cinco virgens tolas. Elas desejavam ir ao
encontro do Esposo. Qual é o significado de "sair ao encontro do
Esposo?" Ir com o coração, estar esperando por sua vinda. Mas Ele tarda.
"E, tardando o esposo, tosquenejaram todas". O que significa
"todas"? Tanto as tolas quanto as sábias "tosquenejaram todas e
adormeceram". Este sono é bom? O que quer dizer este sono? É que com a
tardança do Esposo, "por se multiplicar a iniqüidade, o amor de muitos se
esfriará" (Mt 24.12)? Devemos entender este sono assim? Não gosto disso.
Eu lhes direi por quê. Porque entre elas estão as virgens sábias; e,
certamente, quando o Senhor disse: "E, por se multiplicar a iniqüidade, o
amor de muitos se esfriará", Ele continuou, dizendo: "Mas aquele que
perseverar até ao fim será salvo" (v. 13). Onde estariam essas virgens
sábias? Elas não estão entre aquelas que vão **perseverar até ao fim"?
Elas não seriam admitidas entre todas, irmãos, por nenhuma outra razão senão
porque elas perseverariam até o fim. Nenhuma frieza de amor se insinuou sobre
elas; nelas o amor não esfriou, mas conserva seu brilho ainda até o fim. E
porque brilham até o fim, as portas do Esposo estão abertas para elas. É dito a
elas que entrem, como àquele servo excelente: "Entra no gozo do teu senhor"
(Mt 25-21). Qual é o significado de "todas dormiram"? Há outro sono
do qual ninguém escapa. Lembram-se da declaração do apóstolo: "Não quero,
porém, irmãos, que sejais ignorantes acerca dos que já dormem, para que não
vos entristeçais, como os demais, que não têm esperança" (1 Ts 4.13), ou
seja, concernente àqueles que estão mortos? Por que eles são chamados 'os que
já dormem", mas estão no seu próprio dia? Então, "todas
dormiram". Vocês acham que pelo fato de alguém ser sábio, não morre? Seja
a virgem tola ou a sábia, todas sofrem o sono de morte igualmente.
Mas
os homens dizem continuamente para si mesmos: "Eis que o Dia do Julgamento
está vindo. Tantos males estão acontecendo, tantas tribulações se multiplicam;
vejam, todas as coisas que os profetas disseram estão quase cumpridas. O Dia do
Julgamento já está às portas". Aqueles que falam assim, em fé, superam
astuciosamente tais pensamentos para "encontrarem-se com o Esposo".
Mas, vejam! guerra sobre guerra, tributação sobre tribulação, terremoto sobre
terremoto, fome sobre fome, nação contra nação e o Esposo ainda não veio.
Enquanto se espera que Ele venha, todos os que dizem: "Vejam, Ele está
vindo, e o Dia do Julgamento nos encontrará aqui", dormem. Enquanto dizem
isto, continuam a dormir. Que cada um de nós tenha em vista este seu sono e
persevere até ao seu sono de amor; que o sono o ache esperando assim. Pois,
suponha que ele dormiu. "Aquele que dorme não ressuscitará?" Então,
"todas dormiram". Tanto as sábias quanto as virgens tolas, na parábola,
todas dormiram.
"Mas,
à meia-noite, ouviu-se um clamor". O que é "à meia-noite"?
Quando não há nenhuma expectativa, absolutamente nenhuma convicção. A noite
indica ignorância. O indivíduo faz um cálculo consigo mesmo: "Vejam,
tantos anos se passaram desde Adão, e os seis mil anos estão se completando, e
então imediatamente de acordo com a computação de certos expositores, o Dia do
Julgamento virá". Contudo, estes cálculos vêm e passam, e ainda a chegada
do Esposo tarda, e as virgens que haviam ido encontrá-lo, dormem. E, vejam,
quando Ele não é esperado, quando os homens dizem: "Os seis mil anos foram
esperados, e, passaram-se. Como saberemos quando Ele virá?" Ele virá à
meia-noite. O que significa "virá à meia-noite"? Virá quando vocês
não estiverem cientes. Por que Ele virá quando vocês não estiverem cientes?
Ouçam o próprio Senhor: "Não vos pertence saber os tempos ou as estações
que o Pai estabeleceu pelo seu próprio poder" (At 1.7). "O Dia do
Senhor", diz o apóstolo, "virá como o ladrão de noite" (1 Ts
5-2). Portanto, vigiem de noite para que não sejam surpreendidos pelo ladrão.
Pois o sono da morte — quer vocês durmam ou não — virá.
Mas,
à meia-noite, ouviu-se um clamor" (Mt 25.6). Que clamor foi este. senão
acerca do qual o apóstolo diz: "Num abrir e fechar de olhos, ante a última
trombeta"? "... porque a trombeta soará, e os mortos ressuscitarão
incorruptíveis, e nós seremos transformados" (1 Co 15-52). E quando o
clamor foi dado à meia-noite: "Aí vem o esposo!", o que se segue?
"Então, todas aquelas virgens se levantaram". O que significa todas
"elas" se levantaram? "Vem a hora", disse o próprio Senhor,
"em que todos os que estão nos sepulcros ouvirão a sua voz [...1 [e]
sairão" (Jo 5.28,29). Então, ante a última trombeta. todos se levantarão.
"As loucas, tomando as suas lâmpadas, não levaram azeite consigo. Mas as
prudentes levaram azeite em suas vasilhas, com as suas lâmpadas" (Mt
25.3,4). Qual é o significado de "não levaram óleo em suas vasilhas"?
O que quer dizer "em suas vasilhas"? Em seus corações. O apóstolo
diz: "Nossa glória é esta, o testemunho de nossa consciência". Há o
óleo, o óleo precioso; este óleo é proveniente do dom de Deus. Os homens podem
pôr óleo em suas vasilhas, mas não podem criar a azeitona. Vejam, eu tenho
óleo, mas vocês criaram o óleo? É proveniente do dom de Deus. Vocês têm óleo.
Levem-no consigo. O que é "levá-lo convosco"? Tenham-no dentro de si
para agradar a Deus.
Essas
virgens tolas que não levaram óleo consigo desejam agradar os homens mediante
essa abstinência, por meio da qual são chamadas virgens, e mediante suas boas
obras, quando parecem levar lâmpadas. E se desejam agradar os homens, e por
conta disso fazem todas essas obras louváveis, elas não levam óleo consigo. Se
vocês levam-no consigo, levam-no no interior onde Deus vê; ali levam o
testemunho de sua consciência. Pois aquele que anda para ganhar o testemunho de
outrem não leva óleo consigo. Se vocês se privam das coisas ilícitas e fazem
boas obras para serem louvados pelos homens, não há óleo interior. E assim,
quando os homens começam a deixar seus louvores, as lâmpadas falham. Observem,
amados, antes que essas virgens dormissem, não está escrito que as lâmpadas se
apagavam. As lâmpadas das virgens sábias queimavam com um óleo interior, com
a garantia de uma boa consciência, com uma glória interior, com uma caridade
interna. Contudo, as lâmpadas das virgens tolas também queimavam. Por que
queimavam? Porque ainda não havia falta dos louvores dos homens. Mas depois que
se levantaram, na ressurreição dos mortos, elas começaram a preparar as
lâmpadas, ou seja, começaram a se preparar para prestar contas a Deus das suas
obras. E porque não há ninguém a louvar, cada um está inteiramente engajado em
sua própria causa, não há ninguém que não pense em si mesmo, então não havia
ninguém para lhes vender óleo; assim as lâmpadas começaram a falhar, e as tolas
correram até as cinco sábias e disseram: "Dai-nos do vosso azeite, porque
as nossas lâmpadas se apagam" (Mt 25.8). Elas procuravam o que se
acostumaram a buscar, para brilhar com o óleo de outrem, para andar segundo os
louvores de outrem.
Porém,
as sábias disseram: "Não seja caso que nos falte a nós e a vós; ide,
antes, aos que o vendem e comprai-o para vós" (v. 9). Esta não era a
resposta daqueles que dão conselho, mas daqueles que escarnecem. Por que elas
escarnecem? Porque eram sábias, porque a sabedoria estava nelas. Porque elas
não eram sábias de si mesmas; mas essa sabedoria estava nelas, acerca da qual
está escrito em certo livro, ela dirá àqueles que a menosprezaram, quando eles
caíram nos males que ela as prenunciou: "Eu rirei em sua destruição".
O que significa, então, esta zombaria das virgens sábias diante das tolas?
"Ide.
antes, aos que o vendem e comprai-o para vós", vocês que nunca viveram
bem, mas pelo fato de os homens os louvarem, eles lhes vendiam óleo. O que
significa "lhes vendiam óleo"? Vendiam louvores, elogios. Quem vende
elogios, senão os lisonjeiros? O quanto teria sido melhor vocês não terem
aquiescido com os lisonjeiros e terem levado óleo consigo, e em prol de uma boa
consciência terem feito todas as boas obras. Então vocês podem dizer: "O
justo me corrigirá em misericórdia e me reprovará, mas o óleo do pecador não
engordará minha cabeça". Antes, ele diz, que o justo me corrija, que o justo
me reprove, que o justo me esbofeteie, que o óleo do pecador engorde minha
cabeça. O que é o óleo do pecador, a não ser as blandícias do lisonjeiro?
Então,
"ide, antes, aos que o vendem"; isto vocês se acostumaram a fazer.
Mas nós não lhes daremos. Por quê? 'Não seja caso que nos falte a nós e a
vós". O que significa 'não seja caso que nos falte"? Isto não foi
falado em falta de esperança, mas em humildade sóbria e piedosa. Pois embora o
homem bom tenha uma boa consciência, como ele sabe como Deus pode julgar quem
não é enganado por ninguém? Ele tem uma boa consciência, nenhum pecado
concebido no coração o solicita, contudo, ainda que sua consciência seja boa,
por causa dos pecados diários da vida humana, ele disse a Deus:
"Perdoa-nos as nossas dívidas"; considerando que ele fez o que vem a
seguir, "assim como nós perdoamos aos nossos devedores". Ele repartiu
o pão aos famintos de coração, de coração ele vestiu os desnudos; daquele óleo
interior ele fez boas obras, e contudo nesse julgamento até sua boa consciência
treme.
Vejam
então o que significa "dai-nos do vosso azeite". Foi dito a cias:
"Ide, antes, aos que o vendem". Considerando que vocês estavam
acostumados a viver segundo os louvores dos homens, vocês não levam óleo
consigo; mas não lhes podemos dar nada, para que "não seja caso que nos
falte a nós e a vós". Pois dificilmente julgamos a nós mesmos, quanto
menos julgaremos vocês? O que significa "dificilmente julgamos a nós
mesmos"? Porque "quando o Rei justo se assentar no trono, quem se
gloriará que o seu coração é puro?" Pode ser que você não descubra nada em
sua própria consciência. Mas aquele que vê melhor, cujo olhar divino penetra as
coisas mais profundas, descobre algo; Ele vê que pode ser algo, Ele descobre
algo. Quanto é melhor você lhe dizer: "Não entres agora em julgamento com
o teu servo", quanto melhor: "Perdoa-nos as nossas dívidas".
Porque também lhe será dito por causa dessas tochas, por causa dessas lâmpadas,
"tive fome, e deste-me de comer". E então? As virgens tolas também não
fizeram o mesmo? Sim, mas elas não o fizeram diante dEle. Como o fizeram?
Conforme, que Deus nos livre, Ele disse: "Guardai-vos de fazer a vossa
esmola diante dos homens, para serdes vistos por eles; aliás, não tereis
galardão junto de vosso Pai, que está nos céus. [...] E, quando orares, não
sejas como os hipócritas, pois se comprazem em orar em pé nas sinagogas e às
esquinas das ruas, para serem vistos pelos homens. Em verdade vos digo que já
receberam o seu galardão" (Mt 6.1,5). Elas compraram óleo, deram o preço, não
foram defraudadas pelos louvores dos homens: buscaram os louvores dos homens e
os tiveram. Estes louvores dos homens não as ajudaram no Dia do Julgamento. Mas
as outras virgens, como o fizeram? "Assim resplandeça a vossa luz diante
dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem o vosso Pai, que
está nos céus" (Mt 5.16). Ele não disse: 'podem glorificar você".
Porque você tem óleo de si mesmo. Orgulhe-se e diga: Eu o tenho; mas tenho o
óleo dEle, "e que tens tu que não tenhas recebido?" Assim desse modo
agiu uma, e de outro, a outra.
Não
é de se admirar que "tendo elas ido comprá-lo", enquanto buscavam por
pessoas por quem serem louvadas, não acharam nenhuma; enquanto estão buscando
por pessoas por quem serem consoladas, não acham nenhuma; que a porta é aberta
e "o esposo chega"? A Noiva, a Igreja, é glorificada com Cristo,
para que os vários membros se reúnam no seu todo. "... e as que estavam
preparadas entraram com ele para as bodas, e fechou-se a porta" (Mt
25.10). Então as virgens tolas vieram cm seguida; mas tinham comprado ou
encontrado óleo de quem pudessem comprar? Portanto, acharam as portas fechadas;
passaram a bater, mas era muito tarde.
É
dito, e é verdade, não se trata de declaração enganosa: "Batei, e
abrir-se-vos-á"; mas agora quando é o tempo da misericórdia e não quando é
o tempo do julgamento. Pois esses tempos não podem ser confundidos, visto que a
Igreja canta ao seu Senhor da "misericórdia e julgamento". É o tempo
da misericórdia; arrependam-se. Vocês podem se arrepender no tempo do
julgamento? Então, vocês serão como essas virgens contra quem a porta estava
fechada. "Senhor, senhor. abre-nos a porta!" O quê! Elas não se
arrependeram por não terem levado óleo consigo? Sim, mas de que proveito foi o
seu último arrependimento, quando a verdadeira sabedoria escarneceu delas? Portanto,
'a porta estava fechada". E o que lhes foi dito? "Eu não vos
conheço". Ele não as conhecia, aquEle que conhece todas as coisas? O que
Ele quer dizer com "eu não vos conheço"? Eu as repilo, Eu rejeito
vocês. Segundo meu conhecimento, Eu não as reconheço; meu conhecimento não
conhece vícios. Agora, isto é coisa maravilhosa, não conhece vícios e julga os
vícios. Não os conhece na prática; julga reprovando-os. Assim, "não vos
conheço".
As
cinco virgens sábias vieram e "entraram". Quantos de vocês, meus
irmãos, estão na profissão do nome de Cristo! Que haja entre vocês as cinco
sábias, mas que não sejam somente cinco. Que haja entre vocês as cinco sábias
que pertencem a esta sabedoria do número cinco. Pois a hora virá, e vem quando
não sabemos. Virá à meia-noite; vigiem. Assim o Evangelho conclui:
"Vigiai, pois, porque não sabeis o Dia nem a hora" (Mt 25.13). Mas se
todos dormirmos, como vigiaremos? Vigiem com o coração, vigiem com fé, vigiem
com esperança, vigiem com amor, vigiem com boas obras; e então, quando
dormirem no corpo, virá o tempo em que vocês ressuscitarão. E quando vocês
tiverem ressuscitado, preparem as lâmpadas. Então não se apagarão mais, serão
renovadas com o óleo interno da consciência; o Noivo os abraçará no seu abraço
espiritual, Ele os trará à sua casa, onde vocês nunca dormirão, onde sua
lâmpada nunca se apagará. Porém, no momento estamos no trabalho, e as nossas
lâmpadas alumiam entre os ventos e as tentações desta vida. Mas deixemos que
nossa chama queime fortemente, que o vento da tentação aumente o fogo, em vez
de apagá-lo.
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